COVID-19 É DOENÇA OCUPACIONAL: O CONFLITO ENTRE O ART. 20 DA LEI 8.213/99 E A DECISÃO DADA PELO STF.
- Valério e Corbani Advocacia
- 12 de mai. de 2020
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Não é novidade que o STF publica decisões ao arrepio das leis, liminar ou não, contrariando até mesmo a literalidade da Constituição - a qual, em tese, o teria como Guardião - e legislação infraconstitucional.
Aqui pretendemos não só entender como esta decisão foi feita, seus efeitos imediatos e futuros, mas, também, levantar a discussão de que forma isso é bom ou ruim durante a pandemia do novo Coronavírus. Neste sentido, decisão judicial contra a lei existe desde os primeiros passos do Direito na Antiguidade, no Império Romano por exemplo e, por isso, a expressão em latim "contra legem". Não é uma exclusividade do sistema jurídico brasileiro. Mas, por que o juízo decide contra a Lei? A explicação mais recorrente é que a própria natureza da norma não consegue prever todas as hipóteses fáticas que irão demandar sua aplicação e, para não causar grave desequilíbrio e injustiça, a norma é contrariada pelo próprio aplicador. Portanto, acreditamos que o objetivo da decisão liminar do STF, diante do contexto de contaminação mundial proliferada, ausência de medidas para frear o contágio nacional, desinteresse e conflito entre as autoridades do Poder Executivo na Administração Pública, relativização da gravidade da doença, interesses econômicos e financeiros imediatos e diante da óbvia e ululante hipossuficiência do trabalhador, lhe fora conferido precariamente o direito de não ter de empenhar-se em comprovar o nexo causal de contaminação, visto que a alta proliferação da doença o poria em provar algo próximo do impossível (prova diabólica). O Coronavírus pode suprimir sua capacidade respiratória involuntária natural ou simplesmente não dar sintoma algum. Mas algo não muda: ele continua se espalhando. Uma boa quarentena com efeitos satisfatórios demanda a execução de um projeto emergencial satisfatório e funcional para que as pessoas possam sobreviver durante a paralisação econômica em que explora atividades ou vende sua mão-de-obra ao empregador. Não é surpresa que mesmo depois de deflagrada a contaminação dos primeiros casos no Brasil, mesmo nas cidades que tiveram os primeiros casos, o trabalhador continuou sua rotina de trabalho normalmente: enfrentando transporte público, fazendo entregas, contato com clientes e terceiros, documentos, cuidando de suspeitos contaminados de covid-19, enfrentando filas enormes em bancos para receber míseros R$ 600,00, desamparados, já que muitos foram demitidos. Caos. O contexto é de Caos Social. Sequer há testagem de contaminados em números satisfatórios por milhão de pessoas para a obtenção de dados e adoção de medidas de profilaxia e contenção de danos. É por isto que acreditamos ter sido considerado para o STF decidir liminarmente contra o texto do art. 20 da Lei 8.213/91, pois é decisão em estado calamitoso, pois o trabalhador necessita continuamente se expor em ambientes populosos e movimentados para poder sobreviver e irá necessitar ter renda caso esteja contaminado e não possa expor outras pessoas à contaminação. Porquanto o Benefício de Incapacidade Acidentário, conjugado com a MP 936 para Manutenção de Emprego e Renda em auxílio ao empregador, é que buscam prover a base econômica para a manutenção do funcionamento da lógica neoliberal, sistema adotado e conservado pelo art. 170 da Constituição da República, buscando preservar a dignidade humana. Juridicamente falando, uma decisão do STF, por si só, não vincula o sistema jurídico brasileiro como um todo, porém, levanta uma possibilidade de sucesso da pretensão em face do posicionamento da Corte. Para que o STF decida e ressoe sobre todo o sistema, no uso dos instrumentos necessários, é essencial que seja entendimento sumular (vinculante ou não vinculante, mas este em tema constitucional) ou decisão em controle concentrado de constitucionalidade. Por outro lado, seguindo este Fio de Ariadne do art. 926 do Código de Processo Civil, se a decisão for do STJ sobre matéria previdenciária, portanto infraconstitucional, dará ensejo à uniformização de jurisprudência, conforme o art. 927/CPC. E então? O que esperar desta decisão?
O INSS irá sempre reconhecer os casos de Coronavírus como doença ocupacional a partir de agora? De início, não se poderia esquecer da queda da MP 905/19, logo, se o Covid-19 for contraído na ida ou volta do trabalho, ensejará o acidente de trabalho, expedição de CAT e direito ao Auxílio Doença Acidentário. Esta decisão do STF provém de decisão liminar em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, ou seja, em controle concentrado de constitucionalidade, ainda que em situação precária por originar de análise e julgamento sumário do mérito, inexaurido o processo de conhecimento, portanto cumpre o requisito do eco jurisprudencial previsto no art. 926/CPC. Nesta direção, este entendimento, da mesma forma que a liminar da prisão em 2ª instância, inconstitucional, pode ser revertida futuramente e com efeitos modulados no tempo e espaço que, para o Direito do Trabalho, é inaplicável o "tempus regit actum", ou melhor, efeitos aplicáveis a partir da data da publicação da decisão ou da forma disposta no próprio acórdão.
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